É provável que você já tenha ouvido falar do procedimento de Recuperação Judicial que as empresas utilizam quando ficam endividadas. Trata-se de uma ferramenta que tem como objetivo, reorganizar a casa, ajustar as pendências financeiras e evitar a temida falência. Saiba que há possibilidade de se utilizar esse mesmo procedimento para o produtor rural.
Isso mesmo! É possível que o empresário rural também seja amparado pelo procedimento da Recuperação Judicial. Quer saber como? Vamos aos esclarecimentos.
Quem pode ser considerado Empresário Rural
Empresário rural, é todo aquele exerce profissionalmente uma atividade econômica ligada ao uso, cultivo, exploração da terra, mediante desempenho de atividades de natureza agrícola, pecuária, de extração e exploração vegetal e animal.
Considera-se atividade empresária, toda atividade econômica, organizada para a produção ou a circulação de bens, ou de serviços, inclusive a que se configura pelo desenvolvimento de um ciclo biológico como ocorre com a atividade agrária.
Logo, é uma exigência, para o enquadramento como empresário, que o produtor coloque em circulação sua produção, não sendo considerado empresário, o que produz para própria subsistência.
Todo empresário é obrigado a se inscrever no Registro Público de Empresas Mercantis do local de sua sede para exercer a atividade de modo regular. Já o empresário rural, tem tratamento diferenciado contando com a opção de requerer ou não sua inscrição.
Esse tratamento diferenciado, decorre da garantia prevista em lei (art. 970 do Código Civil), que garante ao empresário rural o tratamento favorecido, diferenciado e simplificado quanto à inscrição e aos efeitos decorrentes da inscrição.
Como Funciona?
A Recuperação Judicial possibilitará ao produtor, fazer uma assembleia-geral com seus credores, visando reajustar toda a estrutura para o pagamento de suas dívidas, com o objetivo de se manter financeiramente estável e assim dar continuidade a atividade empresarial.
A Lei de Recuperação Judicial, exige como requisito para o processo recuperacional a atividade regularmente exercida há mais de 2 anos. Considerando que o art. 971 do Código Civil considera regular a atividade empresarial rural, independentemente do registro na Junta Comercial, mostra-se plenamente possível sua aplicação ao caso do produtor rural.
Feita a inscrição, o empresário rural, será equiparado ao empresário comum, que é obrigado a registro. Ou seja, poderá inclusive pedir a Recuperação Judicial.
O atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, ainda que o produtor, tenha se inscrito na junta recententemente e não tenha cumprido o requisito da inscrição prévia de 2 anos, terá direito a Recuperação Judicial, tendo em vista que, ao fazer o registro, o produtor apenas declara formalmente a atividade que já exercia com regime empresarial e não é o simples registro que o constituirá como empresário rural.
A Recuperação Judicial é sempre uma vantagem?
É necessário ressaltar que a Recuperação Judicial não é um procedimento com garantia total de sucesso. Caso a assembleia aprove o plano de recuperação e o produtor consiga cumprir com tudo o que foi definido, o resultado será muito bom, mas a possibilidade de que nem tudo flua tão bem assim existe e deve ser considerada.
Daí se faz necessária uma análise aprofundada da real situação do empresário rural, para que se entenda a viabilidade ou não da aplicação da Recuperação Judicial ao seu cenário.
O primeiro passo é fazer um levantamento patrimonial e contábil para entender a efetiva situação do produtor, e analisar, a partir dessa conclusão, a possibilidade de uma gestão administrativa e jurídica sobre seu cenário, resolvendo problemas pontualmente ou a necessidade realmente do processo recuperacional.
Sendo assim, o produtor rural poderá ter direito a recuperação judicial, desde que desenvolva a atividade rural de modo organizado, profissional e voltado ao mercado há mais de dois anos e cuja inscrição na junta Comercial seja anterior à distribuição do pedido, para fins meramente procedimentais.
Aline Clécia, advogada, graduada pela PUC/GO, Pós Graduanda em Direito Civil e Processual Civil, Membro da Comissão Especial de Direito do Agronegócio da OAB Subseção de Rio Verde, Goiás.
Referências:
CARROZZA, A. Lezioni sul direito agrário. Elementi Di Teoria Generale. 2. ed. Milano: Giuffrè, 1988. p. 29.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. TP. 2210 MT 2009/0205330-2, Relator: Ministro João Otávio de Noronha, Publ. 02/08/2019.
BRASIL, Tribunal de Justiça de Goiás, Agravo de Instrumento ( CPC ) 5630870-04.2019.8.09.0000, Rel. Des(a). JAIRO FERREIRA JUNIOR, 6ª Câmara Cível, julgado em 22/06/2020, DJe de 22/06/2020)